CENA ÚNICA – A RIMA JÁ AJEITADA
Numa tabuleta se lê:
A rima está ajeitada
conforme se pôde ver.
Não se assustem, por favor
Com o que aqui acontecer.
É tudo bem conhecido
do eleitor arrependido,
mas é bom para aprender.
Sala do Prefeito. Teodorico está nervoso, vai de um lado a outro. Está acompanhado de seu assessor, Malote, fiel escudeiro de todas as horas, todas as horas mesmo.
TEODORICO: Não me fale mais no assunto!
MALOTE: Mas... mas... Teodorico...
TEODORICO: Home, eu num já lhe disse?
MALOTE: O senhor já é tão rico.
TEODORICO: Malote, meu fí, eu falei...
MALOTE: Já sei, não precisa fazer bico.
TEODORICO: Num teve as bendita inleição?
Butei dinheiro na campanha.
Comprei voto como a porra,
agora que eu tô na manha,
tão quereno me expulsar?
Pois aqui ninguém me apanha.
MALOTE: Mas, meu prefeito...
TEODORICO: Num saio nem fudeno.
MALOTE: Mas, Teodorico...
É o povo quem tá quereno.
TEODORICO: O povo! Que porra de povo!
MALOTE: Tu acaba se perdeno.
TEODORICO: Num assino de jeito nenhum!
MALOTE: Mas assim tu fica só.
TEODORICO: Só tem um ano. Quer me fudê?
Num saio e desato esse nó.
MALOTE: Então lascou-se tudo,
e a coisa virou pó.
TEODORICO: Se eu assinar o documento
É a minha perdição.
MALOTE: Se num assinar dá no mesmo,
já te chamam de ladrão.
TEODORICO: Num acredito que tu queira
que eu assine a cassação.
MALOTE: É a maldita cassação
ou tu fica encrencado.
TEODORICO: Mais do que isso é impossível,
eu já tô todo lascado.
MALOTE: Mas pode ficar pior,
se parar no juizado.
Aí é tanta confusão,
processo, julgamento,
apuração de contas.
Vão cobrar nesse momento.
TEODORICO: Num assino, num assino.
E nem dou depoimento.
MALOTE: O pobrema, Teodorico
é tu bater na chefatura Federal,
vai ser preso e humilhado
até em rede Nacional.
Pode um dia ser lembrado
como um grande marginal.
TEODORICO: Mas o que foi que eu fiz?
MALOTE: Nada! Nada mesmo Prefeito.
Esse é o táli do problema:
toda causa tem efeito.
TEODORICO: Tu é quem tá dizeno,
pelo povo fui eleito.
Distribuí muita cumida,
galinha, peixe e pão,
todo povo está feliz
com minha dedicação.
Diga que num foi, diga?
MALOTE: Dizeno na vera, num foi não.
Nós compramo as comida
super-faturamo as nota feita,
só compramos a metade.
distribuimo tudo na treita,
cadinho aqui, cadinho ali,
e faturamo uma nota preta.
TEODORICO: E foi? Foi? Tava inté isquicido.
MALOTE: Lembra da sua última viagem?
TEODORICO: Lembro muito, sim senhor.
MALOTE: Ganhou dinheiro, fez sacanagem.
TEODORICO: Nisso tu tá certo!
Eu só quis levar vantagem.
MALOTE: E o senhor que autorizou.
Eu até falei: vai dar na pinta,
é muito, muito dinheiro mesmo,
talvez o povo não sinta.
Mas na Câmara, os Vereador?
Não vai ter esse que minta.
juntou a esses desvios
outros mais...
TEODORICO: isso eu num sei.
Pra isso contratei muita gente,
MALOTE: É... eu bem que te avisei.
Contratou tanto parente,
Filha, genro...
TEODORICO: ...até gay.
MALOTE: Isso é outra história
Outro tipo de situação
Opção sexual e competência
Nepotismo né isso não
Estamos falando aqui
Do DNA da corrupção.
Cada qual desviando o seu.
Na hora dos projetos, na ação
da saúde, limpeza, saneamento,
transporte, turismo, educação,
num dava pra fazer nada.
Dinheiro num tinha não.
TEODORICO: Ô, seu fí da peste!
De que lado tu tá mermo?
MALOTE: Ave Maria! Teodorico.
Sem tu ficarei a ermo,
Perdido, sem pé nem mão.
Fico com tu, até enfermo!
(Fragmento de Teodorico Majestade: as últimas horas de um prefeito)