Jô Bilac é um dos dramaturgos mais produtivos e encenados do Brasil. Com uma produção continuada, o autor carioca teve 18 textos montados nos últimos 10 anos. Foi vencedor do Prêmio Shell de Dramaturgia 2011 pelo texto Savana Glacial, recebeu o Prêmio Cesgranrio 2014 como melhor autor, além de APTR, APCA-SP, FITA, Shell e Prêmio Botequim Cultural pelo texto Conselho de Classe. Beije minha lápide foi indicada aos prêmios APTR e Shell 2015 como melhor dramaturgia, Fatal recebeu menção nos prêmios Shell e Cesgranrio 2016, e Rio diversidade foi indicada na categoria projeto inovação no Shell 2017. Esses são apenas alguns dos prêmios e indicações de Jô Bilac, cuja lista é enorme, corroborando o reconhecimento que o autor vem recebendo no Brasil e no exterior.
Seus textos foram encenados por importantes nomes do teatro brasileiro, como Bia Lessa, Monique Gardenberg, Marco Nanini e Daniela Thomas, teve também inúmeras montagens e publicações fora do país, em lugares como Paris, Nova Iorque, Estocolmo, Bogotá e Londres. Seu texto Fluxorama foi publicado pela reconhecida Universidade de Yale, nos Estados Unidos. Além disso, Bilac foi convidado para dar palestras em diversas feiras literárias fora do país, como na França, Alemanha, Suécia, Colômbia, Itália e nos Estados Unidos, e em de diversas cidades do Brasil, onde sua obra é amplamente estudada, tanto em cursos de teatro em universidades quanto em cursos de formação em dramaturgia, que, graças a importantes movimentos encabeçados por dramaturgos da atualidade, estão crescendo.
“O teatro é cada vez mais, para mim, onde podemos rever nossa própria história e nossa condição humana. Esse paradoxo entre vida e morte me move muito”, afirma Jô Bilac. O dramaturgo, que confessa ter sido um ator tímido, além de diretor que levava suas peças à cena, começou a escrever aos 19 anos e nunca mais parou. Formado pela Escola de Teatro Martins Pena, no Rio de Janeiro, o dramaturgo comenta que estudou atuação porque não havia ensino regular em dramaturgia, sua paixão desde cedo, e que isso lhe permitiu olhar para a cena como um todo e pensar o trabalho com o texto também sob a perspectiva da atuação e da direção. Assim, em 2007, fundou a Cia. de Teatro Independente, que ficou conhecida por montagens como Cachorro! (2007) e Rebu (2009).
Em 2013, com Conselho de Classe, em uma montagem da Cia. dos Atores, Bilac alcançou outro tipo de repercussão, consolidando-se como um dos mais talentosos nomes da nova dramaturgia brasileira. Em Conselho de Classe, vemos um questionamento acirrado e bem humorado sobre o sistema de ensino, sobre a precariedade das escolas públicas e das relações hierarquizadas que caracterizam o ambiente escolar. “Queria refletir sobre essa instituição que ensina o verbo ‘to be’, mas não ensina os direitos e deveres de um deputado estadual, um senador, os limites de poder de um presidente, por exemplo. E o que faz ainda esse lugar ser ainda tão conservador?”, afirma o autor. Na obra, vemos um conselho escolar depois que a diretora foi agredida por um grupo de alunos e entrou em licença médica. O assunto da reunião passa a ser a briga, revelando um teatro político que aponta a violência e desequilíbrio nas relações de ensino, questionando o que entendemos por educação em um país como o Brasil. Sua peça ganhou uma adaptação da Rede Globo para a série A última chamada (2019), na qual o autor assina o roteiro. Como é recorrente na obra de Jô Bilac, as questões sociais são evidenciadas.
Em uma entrevista dada à Vogue, quando questionado sobre sua inspiração para escrever em um país tão desigual, racista e sem representatividade como o Brasil, o dramaturgo responde: "Venho de uma cultura da oralidade, como são as culturas africanas e indígena, minhas origens, que é o que eu escrevo. Eu não escrevo romance, não escrevo crônica. Eu escrevo roteiro, escrevo dramaturgia, porque é uma forma de me comunicar com a minha tribo e de encontrar a minha voz dentro de um mundo que me exclui. Um mundo que me diz o tempo todo que ser negro é um impedimento para se tornar um escritor. […] Não ocupo aquele lugar que a sociedade espera de mim nos meus textos, que é 'o lugar de fala de um homem negro'. Nos meus textos, falo também da vida. Sou negro, então tudo o que eu escrever será negro também. Gosto quando se dialoga de forma mais cosmopolita, mas sem perder o vínculo com a sua essência, com a sua condição social…”
Essa perspectiva trazida na fala de Jô Bilac acaba permeando toda sua obra, que tem um cunho existencialista forte, revelando questões que problematizam nossa humanidade e nossa relação com o mundo. Em Fluxorama (2013), o autor investiga o fluxo do pensamento de três personagens em situações limites, retomando lembranças e sensações, num fluxo de consciência. Em Insetos, publicada em 2018 pela editora Cobogó, o dramaturgo dá voz a uma polifonia de insetos para se aproximar com humor e perspicácia de questões humanas e sociais, evidenciando também uma situação limite. Em Os mamutes, lançada pela mesma editora em 2015, questiona as doenças sociais, apresentando Leon, um jovem que precisa de emprego e acaba tentando ser admitido na Mamutes Food, uma multinacional que faz hambúrgueres de carne humana. A peça coloca em questionamento o valor da vida e os princípios que tensionam os limites entre ética, capitalismo e sobrevivência. Seu último trabalho, Pá de call (2021), montado com a Cia. Teatro Independente, problematiza as convenções sociais esvaziadas e como delegamos a outros a responsabilidade por nossos próprios sentimentos.
A obra de Jô Bilac, este jovem e reconhecido dramaturgo, é bastante complexa e consolidada, tendo uma diversidade grande de temáticas, ficções e estilos de escrita. No entanto, questões sociais e existencialistas permeiam suas narrativas, caracterizando uma visão de mundo e assinatura próprias. “Eu acho que a existência é um mistério e dentro deste mistério eu não quero desvendá-lo, quero só conversar com ele” (Jô Bilac).
Camila Bauer